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  • Perfil: A história de amor de Lilian e Luiz Gomes, o Lula – “A companheira de todas as horas”

    Essa reportagem foi publicada em três páginas no jornal Notícias do Dia na edição dos dias 15 e 16 de outubro de 2011 com o título de “Uma rua cheia de política”, título este dado pela editoria. O original é esse aí de cima, onde conto um pouquinho da história de Luiz Gomes, o Lula, ex-prefeito de Joinville (SC) entre 1989/1992, já falecido, com sua Lilian Gomes, esposa, filha, sobrinha e neta de ex-prefeitos da cidade, que mantém viva a memória do marido, e faz um trabalho formidável junto à Rede Feminina de Combate ao Câncer. Espero que os leitores gostem, nessa fase maravilhosa da nossa Feira do Livro de Joinville:

    “Muitas pessoas já passaram pela travessa São José, rua estreita que dá acesso à rua Ministro Calógeras, e que sedia a Associação Catarinense de Ensino, bem próximo ao Hospital São José. Mas certamente muito poucas sabem que dali saíram três prefeitos de Joinville, e um prefeito da vizinha Araquari. O cheiro de história se espalha a partir do sobrado de número 407, residência de Lilian Rachel Colin Gomes. Construída há 76 anos pelo seu pai, o ex-prefeito Rolf Colin (1951-1955), abrigou também o seu falecido marido, também ex-prefeito, Luiz Gomes, o Lula (1989/1992). Na mesma rua ainda moraram o ex-prefeito Pedro Ivo Campos (1973/1976) e o ex-prefeito de Araquari, Higino Aguiar (1961/1965). Um celeiro de políticos que marcaram época.

    “Eu nasci em 29 de outubro de 1937 ali no Hospital São José. Me trouxeram no colo aqui para esta casa, onde moro desde então”, conta dona Lilian na sala onde seu marido Luiz Gomes tinha seu reduto de trabalho. Neta do também ex-prefeito Max Colin, ela guarda com carinho centenas de fotos, documentos, imagens, homenagens, enfim, tudo que se relacione a essa história da família Colin/Gomes. Mas tem mais: o seu bisavô por parte da mãe, Manoel Gomes Tavares (1896-1914) também foi ex-prefeito de São Bento do Sul. Destino ou missão? Dona Lilian responde: “Tenho orgulho da história da família. Mas se paga um tributo muito alto quando se é político, principalmente na família. Mas política não é uma coisa ruim, é necessária, e quem põe a cara prá bater é sim um grande corajoso”, ressalta.

    Na ampla sala de jantar e estar do sobrado histórico, dona Lilian espalha história pela mesa. Fala com alegria, e muita saudade, do seu pai Rolf Colin. “Ele foi o primeiro presidente da Câmara de Vereadores quando voltou a democracia, depois de Getúlio Vargas em 1947. Quem o levou para a política foi o primo João Colin que foi prefeito duas vezes, deputado estadual e secretário de obras do Governo Estadual”, observa. Lilian tinha 10 anos na época, e logo depois foi estudar em Curitiba no Colégio Sion, como interna, voltando definitivamente para Joinville com 16 anos. “Naquele tempo era chique ir para internato! Eu detestava né, mas fiquei, fazer o quê, não dava prá contrariar o papai”, fala sorrindo.

    Por estar interna no colégio, Lilian acompanhou muito pouco as campanhas políticas do pai, mas era sempre presente nos bailes, solenidades, já que a mãe não gostava muito e também era acometida por doenças. “Papai não tinha jogo de cintura para a política. Era muito franco e sofria muito. Teve o primeiro infarto aos 41 anos já na Prefeitura, e o segundo o matou em maio de 1964. Ele morreu em meu ombro… Com ele era pão-pão, queijo-queijo, muito metódico, correto. Sofreu muito, não era mundo para ele”, revela. Companheira do pai, ela lista suas realizações: realização da festa do Centenário de Joinville, criação e construção do prédio da Biblioteca Pública, a lei que declarou o Corpo de Bombeiros Voluntários como de utilidade pública (Lei 381/1953), desapropriação de áreas para alargamento da avenida Procópio Gomes.

    “Mas a principal realização dele foi a construção da adutora de água do rio Piraí em 9 de março de 1955, que abastece a cidade até hoje”, afirma Lilian. Desse fato, ela conta que viajou com o pai ao Rio de Janeiro. Ele buscava fontes de financiamento para a obra. Lá ofereceram “propina” para liberar o dinheiro, e Rolf quase infartou novamente. “Eu vi isso, imagine meu pai! Ficou branco, suava. Logicamente não aceitou. Tivemos de chamar médico e tudo, e ao voltar, foi direto ao Hospital São José”, relembra a filha companheira. Ainda com muitas saudades do pai, tece muitos elogios pela postura de Rolf. “Papai era uma pessoa à frente do seu tempo. Era aberto, amigão nosso, meu e da minha irmã Manja”, diz emocionada. Na época Lilian já namorava o advogado e funcionário do Banco do Brasil, Luiz Gomes, que sequer militava em política.

    Nascido em Tijucas, Luiz Gomes veio para Joinville após estudar no Colégio Catarinense em Florianópolis. Já namoravam desde Curitiba, trocavam cartas. O romance avançou na cidade onde ele encontrou com Lilian nos famosos “footings” – passeios a pé – onde os enamorados flertavam após a missa. “Eu tinha 16 anos quando começamos a namorar. Entre namoro e casamento foram quatro anos e meio. Casamos em 1958 na catedral, entre mil casamentos! A festa foi na Lyra, mas bem simples, e a lua de mel no Rio de Janeiro, com o papai junto, ele pagou a conta né”, conta às risadas. Eles tiveram três filhos, Luiz Alexandre, Fernando e Eduardo, que lhes deram seis netos. Até o início da década de 1970, Luiz Gomes e Lilian viviam normalmente, sem política.

    “Aí o Oswaldo Douat era presidente da Celesc em 1971 e convidou o Lula para trabalhar com ele. Lula aceitou, e ficou como diretor até 1974 em Florianópolis. No ano seguinte resolveu estudar na Esag (Escola Superior de Guerra) no Rio, aí bati o pé e fui junto”, destaca. Ao voltarem em 1976, a surpresa: Lula resolve entrar na política, segundo Lilian, para retribuir o gesto do partido (Arena) na sua colocação na Celesc. “Ele nunca tinha se manifestado político! Para mim, foi surpresa, mas fomos em frente”, comenta a sempre companheira. Lula disputa a Prefeitura contra Luiz Henrique da Silveira e perde. Lilian sempre ao seu lado, com seu Fusca, e ele com a famosa e lendária Veraneio marrom, e as camisas pólo amarelas, marcas registradas do político. “Tinha umas duzentas”, conta ela.

    Enquanto Lula militava na política, Lilian cuidava da família e o ajudava, até que em 1981 por convite da amiga Maria José Lobo Douat, que tinha câncer de mama e buscava tratamento em São Paulo, resolveram fundar aqui a Rede Feminina de Combate ao Câncer, com base no que já existia por lá. “Fui a segunda presidente, e primeira tesoureira. Tivemos muito apoio, muitas amigas voluntárias, e hoje a Rede já tem 30 anos”, comemora Lilian, que atualmente dá palestras sobre a prevenção do câncer em empresas, entidades, e de onde vierem convites. Mas agora está licenciada para voltar no início de 2012. A radioterapia no São José foi uma conquista da Rede Feminina já no governo Luiz Gomes.

    Lula chegou à Prefeitura em 1988 vencendo José Carlos Vieira. Em seu mandato, conta dona Lilian, foram feitos os primeiros assentamentos nos mangues invadidos, construída a escola agrícola, o centrinho Luiz Gomes, criados o IPPUJ e a Fundema, entre outras realizações que ela lembra. “Até o presidente Collor veio aqui ver os assentamentos”, comenta ela. Depois do mandato, Lula tentou se eleger senador, deputado estadual, federal, mas não teve êxito. “Ele ainda foi presidente da Celesc, da SC Gás, e secretário do Desenvolvimento, mas ficou frustrado com as manobras políticas”, relata. O marido morreu em agosto de 2003 aos 70 anos, quando estavam prestes a completar 45 anos de casamento, na mesma sala onde trabalhou por anos no sobrado da Travessa São José.

    “Imagine um homem como Lula, que não parava, aí saiu da SC Gás e parou tudo! Além do coração, problemas na próstata, também a depressão, aí acabou me deixando por aqui”, fala com melancolia. Ativa, ligada em tudo – “ainda milito no PP, meu partido de sempre, acho que sou a mais antiga”- dona Lilian sabe que não pode parar. “Em três anos morreram minha nora, o pai dela e o Lula. Meus netos ficaram comigo, sofreram muito. Não me dei o direito de me deprimir”, revela. Lamenta que o marido não tenha ganho o título de cidadania honorária da cidade, mas fica feliz em ver o nome dele no Centrinho, em escola municipal do Adhemar Garcia. E sobre a política, dá lições. “Hoje tá muito ruim! Tem muita impunidade, ninguém paga pelos desvios, e ainda voltam aos cargos depois, e isso tem de acabar”. Seu desejo é continuar o voluntariado, participar das reuniões do grupo de reflexão e viver no sobrado histórico até quando for possível. “Enquanto eu subir as escadas, vou continuar por aqui”, finaliza.