“Na Teia da Mídia” – 10 anos de lançamento

Um “combo” de erros graves da polícia de SC com erros de apuração e espetacularização da mídia catarinense e nacional que resultaram em destruição de uma família simples e tradicional. Este é o resumo do famoso caso ocorrido no ano 2000 em Joinville que deixou um saldo de nenhuma indenização às vítimas dos erros por parte da grande mídia – Judiciário livrou todos de pagarem pelos erros -, nenhuma punição aos delegados envolvidos e autoridades.

Apenas uma ínfima indenização foi definida pela Justiça para ser paga pelo Estado de Santa Catarina, o que não ocorreu até a morte do cidadão (2018) que foi injustamente exposto como o “Maníaco da Bicicleta”. A mãe faleceu em 2012, e o pai em 2018 um mês antes do filho. Esta é a marca produzida por um falso retrato falado, espetacularização midiática, a destruição de uma família.

Esta trágica história está registrada no livro “Na Teia da Mídia – A história da família Plocharski no caso Maníaco da Bicicleta” de autoria deste jornalista do Palavra Livre e do também jornalista e advogado Marco Schettert, lançado em 15 de dezembro de 2011, portanto há dez anos. A obra, com edição esgotada e encontrada apenas em sebos ou em lojas online, ou Amazon, tem duas partes.

A primeira que conta a história da família e sua relação com a mídia, e o seu enredamento por parte da polícia e da mídia que causaram danos irreparáveis à família. A segunda parte toca na questão jurídica, o dano moral que esteve claramente presente neste caso terrível que ensina como não investigar fatos criminosos, e como jamais apurar, escrever e divulgar imagens e fatos sobre pessoas sem checar, checar, checar, e ter absoluta certeza do que realmente ocorreu. Um “furo” jornalístico não pode valer mais que vidas.

Conheci Marli Plocharski, Ludovico Plocharski, Aluisio Plocharski e Áurea em 2002. Dona Marli, a mãe zelosa pelos seus, ouviu falar sobre um tal de Salvador Neto. Me encontrou e contou sobre como viviam em quase penúria total depois do caso. Falou detalhes, chorou, e pediu ajuda. Pedi autorização à ela para contar a história em livro, ela concedeu. A partir dali a vida se encarregou de adiar o meu trabalho, mas a amizade com a família seguiu forte.

Foto do lançamento do livro em 2011. Ao fundo à esquerda, de branco, Marli Plocharski

Somente em 2011 com o apoio e incentivo do Marco Schettert, conseguimos editar e lançar o livro. Foi um sucesso de vendas e interesse, e deixou dona Marli mais feliz, buscando reparação da imagem do filho Aluisio, que teve a foto indevidamente divulgada como o tal maníaco. Em abril do ano seguinte (2012) realizamos outro evento, e em agosto ela faleceu. Complicações diversas com depressão.

Aluisio e Ludovico viveram até o início de 2018, o primeiro às voltas com depressão, alcool, falta de empregos. O segundo, que havia tentado o suicídio logo após o fato após o ano 2000 e vivia sob o problema da bebida também, tinha se recuperado um pouco, mas o diabetes evoluiu muito. No início daquele ano, em um espaço de um mês, Ludovico e seu filho morrem. Da família ficaram Áurea, o marido Braz e seus filhos. A família nunca mais voltou a ter uma vida normal e em paz, com desentendimentos entre irmãos, tudo iniciado com o “combo” de graves erros da polícia e mídia.

Imagem do lançamento em abril de 20212. Marli já estava mal e foi ao evento mas não quis aparecer na foto

Ao lembrar e marcar esta data, desejo continuar a manter viva a luta de dona Marli e seu Ludovico pela recuperação da dignidade da família. Quero também manter viva a chama por um jornalismo ético, correto, baseado nas premissas básicas ensinadas nas boas faculdades. E que os agentes públicos e autoridades policiais aprendam a ter mais cuidado nas investigações e atos para desvendar crimes.

O livro “Na Teia da Mídia” já foi tema de muitas palestras, documentário acadêmico (clique aqui para ver), e espero que continue a fomentar discussões na área da comunicação, direito, justiça, direitos humanos e segurança pública. Infelizmente, os casos de erros policiais e da mídia não reduziram, aumentaram drasticamente desde 2013 – vide caso Cancellier. Mas não devemos jamais parar de denunciar e se opor a tudo isso.

Reitero aqui a minha gratidão à Áurea Plocharski, por sua resiliência e força, e toda a sua família, bem como a todos que desde aqueles tempos idos ajudaram a colocar o livro de pé, desde o parceiro Marco, diagramador, ilustrador, gráfica, livrarias, professores, todos que estiveram ao nosso lado.

“A injustiça num lugar qualquer é uma ameaça à justiça em todo o lugar” – Martin Luther King

“Se ages contra a justiça e eu permito que assim o faças, então a injustiça é minha”- Mahatma Gandhi

“Teu dever é lutar pelo Direito, mas se um dia encontrar o Direito em conflito com a Justiça, lute pela Justiça”- Eduardo Juan Couture

“A ética deve acompanhar sempre o jornalismo, como o zumbido acompanha o besouro” – Gabriel García Márquez

“O jornalismo é, antes de tudo e sobretudo, a prática diária da inteligência e o exercício cotidiano do caráter” – Cláudio Abramo

“No jornalismo, não há fibrose. O tecido atingido pela calúnia não se regenera. As feridas abertas pela difamação não cicatrizam. A retratação nunca tem o mesmo espaço das acusações” – Felipe Pena

Segundo puxão de orelha – Justiça nega pela segunda vez uma liminar a homem que pretende andar sem máscara em Criciúma (SC)

O mesmo personagem. O mesmo pedido. O mesmo juiz. A mesma decisão. Pela segunda vez o juiz Pedro Aujor Futado Júnior, da 2a. Vara da Fazenda Pública de Criciúma (SC) nega uma liminar a um homem que pretendia andar livremente, sem máscaras, contrariando os decretos municipais, estaduais e nacionais que obrigam o cidadão a usar máscara em caso de circulação pela cidade, sob pena de multa. Yohan Carlos Rabelo Cardoso, o cidadão insistente, desistiu do primeiro mandado que impetrou em julho ao ver negada a liminar, e resolveu entrar com outro mandado de segurança. Não deu certo. O juiz, além de novamente negar a liminar com o mesmo teor da primeira decisão, deu um novo puxão de orelhas ao autor. “O Poder Judiciário não é palco para atuações mambembes de rebeldia mal calculada”, afirma o juiz em parte da decisão.

Após a negação de sua primeira investida, o homem usou redes sociais para criticar o juiz e sua decisão. Nesta segunda investida mudou argumentos, alterou jurisprudências, mas não convenceu o Juiz que reiterou no seu despacho o grave problema de saúde pública que vivemos em todo o mundo com a pandemia do coronavírus. Leia uma parte da decisão:

“A persistência do impetrante é admirável (lembro que o
Poder Judiciário não é palco para atuações mambembes de rebeldia mal
calculada, mais ao gosto dos pueris atores primários protagonistas e
coadjuvantes das fúteis e inúteis redes sociais, onde canastrões
mimados desnudam a sua imaturidade queixando-se dos nãos que a vida
lhes impõe, agredindo pessoas e instituições quiçá mesmo com o
objetivo de alçar vôos aos proscênios do campo político-partidário,
felizmente não sendo esta a conduta nem a intenção do nobre e
impoluto impetrante), mas a conclusão do writ primevo permanece
intacta diante do objetivo exposto, não merecendo outra resposta que
não a mesma que já lhe foi dada anteriormente (por amor ao bom senso
e à brevidade), ipsis litteris”.

Ao final, indeferindo a liminar, o juiz Pedro Aujor Furtado Junior repete a mesma recomendação dada na decisão do primeiro mandado. Ele diz: “Recomenda-se mais uma vez pois ao douto impetrante que use a máscara”. Desta nova decisão sobre o mesmo pedido, ainda cabe recurso ao TJ/SC. (MANDADO DE SEGURANÇA Nº 5013520-38.2020.8.24.0020/SC)


Tecnologia permite a realização de audiências de instrução e julgamento

Desde a suspensão do expediente presencial em razão da pandemia da Covid-19, a prática de inúmeros atos processuais resultou prejudicada. Em Joinville (SC), adaptando-se a esta nova realidade, a 1ª Vara Criminal realiza, nos próximos dias, sua 90ª audiência de instrução e julgamento virtual. A juíza Regina Aparecida Soares Ferreira, responsável pela unidade, destaca que a utilização da tecnologia foi essencial para a realização de todas essas sessões virtuais.

“O uso da tecnologia permitiu que testemunhas fossem ouvidas, que réus fossem interrogados e que acusação e defesa fizessem seus requerimentos sem que necessitassem estar presentes no mesmo recinto”, explica a magistrada.

Pontos negativos e positivos
Mas não só de aspectos positivos consiste o sistema. Regina também pontua algumas questões negativas da utilização do sistema virtual. “As audiências tendem a ser mais longas, pois, por vezes, as pessoas ouvidas não conseguem compreender as perguntas que lhes são dirigidas. Além disso, são frequentes os casos em que as testemunhas não possuem acesso à internet ou que a conexão é falha. Isso sem contar na necessidade de deslocar servidores para organizar a pauta e entrar em contato com estas pessoas para explicar o procedimento que será realizado”, argumenta a juíza Regina Aparecida Soares Ferreira.

Ela aponta outra preocupação em relação a privacidade de juízes e servidores em razão da utilização do programa “WhatsApp Business” em celulares particulares, porque existe a possibilidade de que números pessoais de servidores e juízes sejam revelados, como já ocorreu em certa oportunidade. Como avaliação geral, a juíza classifica a experiência como muito positiva.

“A nova realidade impõe adaptação por parte dos profissionais do Direito. A 1ª Vara Criminal conta, hoje, aproximadamente 93 processos de réus presos preventivamente, sendo que as videoaudiências têm sido essenciais para evitar alegações de constrangimento ilegal por excesso de prazo”, finaliza.

Justiça nega pedido de indenização de empresas de ônibus em Florianópolis

A Justiça da Capital negou liminarmente pedido de indenização no valor de R$ 7,9 milhões, formulado pelo Sindicato das Empresas de Transporte Urbano da Grande Florianópolis (Setuf), por conta dos prejuízos que sofreu ao longo dos últimos dois meses pela suspensão dos serviços decretada pelo Estado em decorrência da pandemia do coronavírus.

A entidade patronal pleiteia esse valor do Governo do Estado como forma de manter as condições mínimas para a retomada dos serviços, que pode ser decretada a qualquer tempo pelas autoridades, de forma a quitar suas despesas com pessoal e garantir a continuidade da prestação do serviço público essencial.

Para a juíza Ana Luisa Schmidt Ramos, da 1ª Vara da Fazenda Pública da comarca da Capital, não há como admitir o pedido. A opção do Poder Executivo em evitar a locomoção de passageiros de transporte público durante a pandemia, assinala a magistrada, está em conformidade com o Estado Democrático de Direito, ao buscar a garantia dos direitos fundamentais à vida e à saúde. “Sendo assim, […] não há como falar em ato ilegal a ensejar indenização”, afirmou.

A magistrada destacou ainda, em sua decisão, que as empresas de transporte coletivo da região poderiam se precaver contra esse impacto mediante adesão à medida provisória do Governo Federal que admitiu a possibilidade de redução proporcional da jornada de trabalho e dos salários de seus empregados em até 70%, e a suspensão temporária dos contratos de trabalho por até 60 dias.  “No entanto, o que se observa – e bem ponderou o Estado de Santa Catarina – é que essas empresas pretendem transferir o ônus econômico do caso fortuito, na sua totalidade, aos cofres públicos”, finalizou a juíza. A ação seguirá seu trâmite até julgamento final do mérito (Autos n. 5034846-45.2020.8.24.0023).

Judiciário brasileiro custou 1,3% do PIB em 2015

palavralivre-custo-judiciario-brasileiroO Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgou ontem (17) um estudo cujos dados mostram que as despesas totais do Judiciário brasileiro foram de R$ 79,2 bilhões em 2015.

O valor representa 1,3% do Produto Interno Bruto (PIB), soma de todas as riquezas produzidas pelo Brasil. Segundo o levantamento, cada cidadão pagou no ano passado R$ 387,56 para garantir o funcionamento do serviço de Justiça.

Os valores fazem parte da pesquisa Justiça em Números, divulgada anualmente pelo conselho e que analisa a situação da Justiça Estadual, Federal, Eleitoral, Militar, Trabalhista e dos tribunais superiores. Os dados não citam o Supremo Tribunal Federal (STF), órgão acima do CNJ na hierarquia do Judiciário.

De acordo com a pesquisa, os gastos com recursos humanos consomem 89% das despesas, que incluem salários de juízes, servidores, empregos de funcionários terceirizados, além de  auxílios, diárias e passagens. Segundo o CNJ, 56% das despesas totais retornam aos cofres públicos por meio do pagamento de custas processuais.

Pela primeira vez, o levantamento avaliou o custo de cada servidor ou empregado do Judiciário da folha de pagamento do ano passado.

De acordo com o Justiça em Números, cada magistrado custa em média R$ 46 mil por mês; cada servidor, R$ 12 mil; funcionários terceirizados custam em média R$ 3,4 mil ao mês e, por fim, cada estagiário, R$ 774, em média. Os valores também incluem pagamentos de verbas indenizatórias e gastos com diárias e passagens.

De forma inédita, o estudo também apontou o tempo de tramitação dos processos. Na fase de execução, a mais importante para o cumprimento da decisão judicial, a média registrada foi de nove anos. Na Justiça Estadual, o tempo de tramitação é de 8 anos e 11 meses, e na Justiça Federal, 7 anos e nove meses.

Processos e conciliação
Os dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também mostram que estão em tramitação em todo o Judiciário cerca de 102 milhões de processos pendentes de decisão definitiva. O número aumentou em relação ao ano de 2014, quando 100 milhões estavam em andamento.

Pela primeira vez na pesquisa, foram avaliados as taxas de resolução de processos por meio da conciliação, modo de resolução de conflitos em que o juiz passou a ser obrigado a propor, após a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil (NCPC).

Segundo os dados, 11% das sentenças proferidas foram homologadas por meio do acordo de conciliação. Na Justiça do Trabalho, o índice passou para 25%. Na Justiça Estadual, o indicador foi de 19,1% e na Federal, apenas 5,6%.

Com informações da Ag. Brasil

Sergio Moro: Herói anticorrupção ou incendiário?

PalavraLivre-moro-heroi-vilaoHoje, as milhares de pessoas que têm saído às ruas para protestar contra a corrupção e o governo se unem na grande admiração pelo juiz de Maringá (PR), responsável pelas decisões da Operação Lava Jato na primeira instância. “Somos todos Moro”, dizem cartazes nas manifestações por todo o país. Para uma grande parte da população, Moro, da 13ª Vara Federal do Paraná, é um herói nacional.

Já simpatizantes do governo o acusam de “agir politicamente” e de inflar os ânimos da população de forma “irresponsável”, favorecendo um “golpe” ao revelar o polêmico áudio de uma ligação entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente Dilma Rousseff, exatamente no dia marcado para a posse do ex-presidente como ministro-chefe da Casa Civil.

Segundo investigadores da Lava Jato, a ligação sugere que Lula foi nomeado ministro nesta quinta-feira para ter foro privilegiado e fugir do alcance de Moro. Dilma nega e acusa o juiz de “afrontar direitos e garantias da Presidência”.

“Todas as medidas judiciais e administrativas cabíveis serão adotadas para a reparação da flagrante violação da lei e da Constituição cometida pelo juiz autor do vazamento”, diz nota emitida pelo Palácio do Planalto.

Para Moro, “havia justa causa e autorização legal para a interceptação” e o caso seria comparável ao do presidente americano Richard Nixon, que renunciou em 1974 acusado de obstrução da Justiça.

Lava Jato
Muito antes da disputa aberta com Dilma, Moro foi arrastado ao centro da crise política brasileira por fazer na Lava Jato algo sem precedentes: investigar, prender e condenar um grande número de empresários e políticos poderosos.

Até o ano passado, por exemplo, se alguém dissesse que o presidente da maior empreiteira do Brasil, Marcelo Odebrecht, iria para a cadeia por corrupção, poucos acreditariam (há algumas semanas, ele foi condenado por Moro a mais de 19 anos de prisão).

“Moro é parte de uma geração de juízes e promotores que se formou depois da ditadura e que tem uma visão democrática e republicana bastante consolidada”, opina José Álvaro Moisés, diretor do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas da USP.

“Ele desafiou essa lógica até então consolidada no Brasil de que quem tem recursos ou poder consegue escapar do alcance da lei.” Há quem tenha uma visão mais crítica – mesmo entre opositores do governo. Alguns juristas, por exemplo, condenam algumas práticas do juiz na Lava Jato – como os que veem uso abusivo do mecanismo de prisões preventivas.

Mesmo a seção do Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil soltou nota de repúdio às escutas de Lula, na qual diz que o procedimento é “típico de estados policiais”.

“É fundamental que o Poder Judiciário, sobretudo no atual cenário de forte acirramento de ânimos, aja estritamente de acordo com a Constituição e não se deixe contaminar por paixões ideológicas”, afirma o comunicado.

Para Renato Perissinotto, cientista político da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Moro parece ter um senso de “missão” muito forte mas, no atual contexto, é natural que desenvolva certa “vaidade”, que queira fazer “história” – e isso influencie seu trabalho. “Apesar de aparentemente ele não ser partidário, sua atuação acaba tendo um caráter político”, diz.

“Ao que tudo indica, essa operação (Lava Jato) vai pegar todo mundo. Vai colocar em xeque o próprio sistema político, que sempre funcionou com base em caixa 2. Mas o problema é que não sabemos o que vai surgir com o colapso do sistema. Pode não ser algo melhor. Podemos ter a ascensão de um líder radical. Enfim, tudo é possível. ”

Tido como sério e reservado – mas com um senso de humor refinado – Moro é filho de um professor de geografia e cresceu em uma família de classe média de Maringá. Ele se formou em Direito em 1995 na Universidade Estadual de Maringá. E em uma palestra para estudantes, recentemente, confessou que até mais da metade do curso se questionava se havia feito a escolha certa.

Mas se havia dúvidas, elas parecem ter durado pouco. Em 1996, com apenas 24 anos, Moro passou em um concurso para se tornar juiz federal. Fez mestrado e doutorado, estudou na escola de direito de Harvard e participou de programas de estudos sobre o combate à lavagem de dinheiro do Departamento de Estado dos EUA.

“Ele é extremamente estudioso e as experiências internacionais parecem ter ajudado muito em sua formação. Cada vez que viaja volta com um monte de livros”, diz Carlos Zucolotto, amigo de Moro e de sua mulher, Rosângela, que chegou a trabalhar em seu escritório de direito trabalhista no Paraná.

Em 2003, com apenas 31 anos, Moro pegou seu primeiro grande caso: o Banestado, que investigou a remessa ilegal de US$ 30 bilhões ao exterior entre 1996 e 2002. Em 2004, participou da Operação Farol da Colina, na qual dezenas de doleiros foram presos. E, em função dessas duas experiências, em 2012 foi convocado pela ministra Rosa Weber para auxiliá-la na investigação do mensalão.

“Ele dava aula na UFPR, que tem muitos acadêmicos de esquerda, e lembro que sua atuação no mensalão causou um certo mal-estar”, diz um jurista do Paraná. Hoje, sites e blogs de esquerda acusam o magistrado de ter ligações com a oposição. Um deles chegou a publicar que sua mulher seria advogada de um político do PSDB – o que ela nega. Outro diz que o pai do juiz teria sido filiado.

“Conheço a família há muitos anos e posso garantir que essas acusações são absurdas e já foram desmentidas”, diz Zucolotto. “Nenhum deles tem ligações com partido algum.”

Um bom ponto de partida para se tentar entender a cabeça de Moro é o artigo que ele publicou em 2004 na Revista Jurídica do Centro de Estudos Judiciários (CEJ) sobre a megaoperação italiana conhecida como Mãos Limpas (Mani Pulite), que precipitou o colapso dos partidos tradicionais desse país e serviu de inspiração para a Lava Jato.

Lá, ele defende práticas e princípios que, mais tarde, gerariam alguma polêmica também no Brasil, como o uso das delações premiadas e das prisões preventivas para se avançar nas investigações, os vazamentos à imprensa e a importância de uma opinião pública engajada para o sucesso da operação.

“Sobre a delação premiada, não se está traindo a pátria ou alguma espécie de ‘resistência francesa'”, escreveu o juiz em 2004.

“Um criminoso que confessa um crime e revela a participação de outros, embora movido por interesses próprios, colabora com a Justiça e com a aplicação das leis de um país.”

Para um jurista crítico, que frequentou a UFPR quando Moro era professor, “ele sabe que para conseguir as informações necessárias para avançar rapidamente nas investigações precisa agir ali no fio da navalha, no limite da legalidade, sempre justificando suas escolhas”. Sobre os vazamentos à imprensa, por exemplo, o juiz defendeu o seguinte no artigo da CEJ:

“A publicidade conferida às investigações teve o efeito salutar de alertar os investigados em potencial sobre o aumento da massa de informações nas mãos dos magistrados, favorecendo novas confissões e colaborações. Mais importante: garantiu o apoio da opinião pública às ações judiciais, impedindo que as figuras públicas investigadas obstruíssem o trabalho dos magistrados, o que, como visto, de fato foi tentado.”

No texto, Moro estava se referindo à Operação Mãos Limpas. Mas não é difícil ver como as suas justificativas para os vazamentos das ligações de Lula cabem hoje nesse mesmo raciocínio.

*Colaborou Camilla Costa, da BBC Brasil em Londres

STF e TRF-4 apontam pelo menos 18 erros de Sergio Moro na Lava Jato

PalavraLivre-sergio-moro-lava-jato-erros-injustica-stf-trfO juiz federal Sergio Fernando Moro manteve prisões com fundamentos genéricos, tenta aplicar uma espécie de juízo universal e violou competência do Supremo Tribunal Federal ao deixar de enviar à corte investigação que citava autoridades com prerrogativa de foro.

Para quem não acompanha de perto a famosa “lava jato”, essas afirmações podem parecer tiradas da recente carta de advogados contrários a medidas tomadas na operação. Todas elas, porém, são conclusões do STF, onde ao menos 11 decisões de Moro foram derrubadas entre 2014 e o início de 2016.

Levantamento da revista Consultor Jurídico identificou outras sete determinações reformadas pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região desde que os processos entraram na 13ª Vara Federal de Curitiba (veja quadro abaixo). Como a maioria dos recursos foi negada, o caso continua em andamento e está próximo de completar dois anos, sem indícios de chegar ao fim.

Advogados apostam que ainda será reconhecida a nulidade de dados sobre contas bancárias na Suíça usadas pelo Ministério Público Federal. O tratado de cooperação jurídica entre o Brasil e a Suíça para matéria penal define que cabe às autoridades centrais dos países fazer pedidos e autorizar a troca de documentos. Mas o MPF trouxe da Suíça documentos sem aval do Ministério da Justiça.

Para o procurador regional da República Vladimir Aras, não houve problema no procedimento, por considerar que contatos prévios com as autoridades suíças permitiram a solicitação de dados “precisos, adequados e completos”.

Uma série de procedimentos da “lava jato” também já foi alvo de questionamentos, como relatou a ConJur. Advogados reclamam de vazamentos seletivos, dizem que a Polícia Federal demorou a informar indícios de envolvimento de deputados federais, apontam disparidade de armas em relação ao MPF e avaliam até que Sergio Moro complementa o trabalho da força-tarefa, com perguntas parciais – segundo cálculos dadefesa da empreiteira OAS, o juiz fez 2.297 questionamentos durante as audiências, enquanto os procuradores fizeram 953.

Em seus despachos, Moro nega prejudicar a defesa. Membros do MPF, por sua vez, reforçam que a maioria dos atos do juiz foi mantida por tribunais superiores até agora. Em julho de 2015, levantamento da força-tarefa concluiu que advogados de defesa só haviam ganhado 3% dos recursos até então. No Superior Tribunal de Justiça, nenhum argumento passou.

Lupa nos atos processuais
O Supremo acabou intervindo para liberar investigados presos em caráter preventivo, mesmo antes que tribunais inferiores analisassem pedidos de Habeas Corpus em colegiado, como é praxe na corte. “É verdade que sobejam elementos indicativos de materialidade e autoria de crimes graves”, reconheceu o ministro Teori Zavascki ao analisar a prisão do ex-diretor da Petrobras Renato Duque, em fevereiro de 2015.

“Porém, o magistrado de primeira instância restringiu-se a valorar a existência de indícios de que o investigado manteria expressiva quantidade de dinheiro no exterior e poderia, em razão disso, fugir do país, subtraindo-se à jurisdição criminal. Não houve, contudo, a indicação de atos concretos atribuídos ao paciente que demonstrem sua intenção de furtar-se à aplicação da lei penal”, afirmou Zavascki em voto seguido por unanimidade na 2ª Turma do STF.

O entendimento abriu caminho para outras 14 solturas, em seis decisões posteriores. Em abril, o ministro Gilmar Mendes afirmou que “o clamor público não sustenta a prisão preventiva”, mesmo que a liberdade de acusados gere sensação de impunidade. No último dia 15 de janeiro, foi o ministro Ricardo Lewandowski, presidente do tribunal, quem constatou “constrangimento ilegal na manutenção da segregação cautelar” do publicitário Ricardo Hoffmann. O ministro considerou suficientes medidas cautelares como entrega do passaporte, recolhimento domiciliar e proibição de contato com outros réus.

Maior repercussão teve a decisão do Supremo de fatiar a “lava jato”, considerando que outros juízos deveriam analisar “filhotes” do caso. “Nenhum órgão jurisdicional pode se arvorar de juízo universal de todo e qualquer crime relacionado a desvio de verbas para fins político-partidários, à revelia das regras de competência”, declarou o ministro Dias Toffoli.

No TRF-4, foram derrubados decretos de prisão preventiva baseados em notícias de jornais. Em abril de 2015, Moro entendeu que a medida era necessária diante de relatos de encontros entre advogados de investigados com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. O juiz assinou a ordem de ofício, sem ser provocado, por entender que os veículos de imprensa têm “credibilidade”.

O desembargador federal João Pedro Gebran Neto, relator do caso, concordou que a conversa com o ministro parecia “moralmente questionável”, mas disse que não havia nos autos nenhum fato concreto justificando “imposição de medida tão extrema” nem faria sentido responsabilizar os acusados por atos de terceiros.

Veja quais foram as decisões revistas em tribunais superiores:

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Prisões irregulares
> Data: 10 de fevereiro de 2015
Quem julgou: 2ª Turma
Quem foi atendido: Renato Duque, ex-diretor da Petrobras

“A custódia cautelar do paciente está calcada em uma presunção de fuga, o que é rechaçado categoricamente pela jurisprudência desta corte”, afirmou o ministro Teori Zavascki. “O fato de o agente supostamente manter valores tidos por ilegais no exterior, por si só, não constitui motivo suficiente para a decretação da prisão preventiva, mesmo porque a decisão não relaciona medidas judiciais concretas de busca desses valores que, para sustentá-la, haveriam de ser certos e identificáveis.”
Clique aqui para ler o acórdão.

> Data: 28 de abril de 2015
Quem julgou: 2ª Turma
Quem foi atendido: Ricardo Ribeiro Pessôa, presidente afastado da empreiteira UTC Engenharia; Sérgio Cunha Mendes, vice-presidente da Mendes Júnior; Gerson de Mello Almada, vice-presidente da Engevix; Erton Medeiros Fonseca, diretor da Galvão Engenharia; e João Ricardo Auler, presidente do conselho de administração da Camargo Corrêa.

“Corréus com situação processual significativamente assemelhada à do ora paciente [Ricardo Pessoa] (…), após firmarem acordo de colaboração premiada, tiveram a prisão preventiva substituída por outras medidas cautelares. Tendo sido eficaz, nesses casos, a substituição da prisão preventiva por medidas alternativas, não há razão jurídica justificável para negar igual tratamento ao ora paciente. É certo que não consta ter o paciente se disposto a realizar colaboração premiada, como ocorreu em relação aos outros. Todavia, essa circunstância é aqui absolutamente irrelevante, até porque seria extrema arbitrariedade (…) manter a prisão preventiva como mecanismo para extrair do preso uma colaboração premiada, que, segundo a Lei, deve ser voluntária”, afirma Zavascki.
Clique aqui para ler o acórdão.

> Data: 5 de maio de 2015
Quem julgou: Teori Zavascki
Quem foi atendido: Dario de Queiroz Galvão Filho, presidente do Conselho de Administração do Grupo Galvão

“A decisão que decretou a prisão preventiva não apresenta justificativa superveniente para o encarceramento cautelar, a não ser conjunto de elementos que reforçariam convicção sobre materialidade e autoria, o que, por si só, como registrado, não é suficiente para decretação da prisão preventiva (…) A instrução criminal foi praticamente concluída, tendo sido colhida toda a prova acusatória (interceptações telefônicas, buscas e apreensões, perícias e oitivas de testemunhas), restando apenas a tomada de alguns depoimentos de testemunhas de defesa. Portanto, no que se refere à garantia da instrução, a finalidade da prisão preventiva já está exaurida.”
Clique aqui para ler a decisão.

> Data: 16 de outubro de 2015
Quem julgou: Teori Zavascki
Quem foi atendido: Alexandrino de Salles Alencar, ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht e ex-vice-presidente da Braskem

“No tocante aos fatos supervenientes relacionados às supostas interferências na colheita da prova, a decisão [de primeiro grau], nesse ponto, não faz qualquer referência ao paciente. Os fatos mencionados dizem respeito unicamente a outro investigado, de modo que não podem ser considerados para a decretação de nova prisão preventiva do paciente. (…)
O outro fundamento do decreto prisional é o da necessidade de resguardar a ordem pública, ante a gravidade dos crimes imputados e o receio de reiteração delitiva. Ocorre que a jurisprudência desta Suprema Corte, em reiterados pronunciamentos, tem afirmado que, por mais graves e reprováveis que sejam as condutas supostamente perpetradas, isso não justifica, por si só, a decretação da prisão cautelar.”
Clique aqui para ler a decisão.

> Data: 15 de dezembro de 2015
Quem julgou: 2ª Turma
Quem foi atendido: Adir Assad, empresário e doleiro

“Não obstante que as instâncias de origem tenham buscado apontar diversos elementos atuais que indicariam o risco de reiteração delitiva de Adir Assad, as circunstâncias indicadas não são suficientes para a manutenção da prisão preventiva”, afirmou Teori Zavascki, acrescentando que o decreto de prisão descreve “conjecturas e intermediações”, sem deixar claro qual seria o papel das pessoas jurídicas citadas nos fatos delitivos nem o período em que Assad teria integrado o quadro societário da empresa Santa Sônia Empreendimentos Imobiliários.
Acórdão ainda não publicado (HC 130.636)

> Data: 15 de janeiro de 2016
Quem julgou: Ricardo Lewandowski
Quem foi atendido: Ricardo Hoffmann, publicitário

“Constato a existência de constrangimento ilegal na manutenção da segregação cautelar do paciente, uma vez que se mostram insuficientes os fundamentos invocados pelo juízo processante para demonstrar a incidência dos pressupostos autorizadores da decretação da preventiva”, afirmou o presidente do STF, ao julgar pedido no plantão do tribunal. Ele aponta jurisprudência consolidada na corte no sentido de que a gravidade do crime e o perigo em abstrato oferecido pelo réu não justificam a prisão preventiva.
Decisão ainda não publicada (HC 132.406)

Competência da 13ª Vara Federal de Curitiba
> Data: 18 de maio de 2014
Quem julgou: Teori Zavascki
Quem foi atendido: Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, e outros presos no início da operação

“De tudo se constata que a autoridade impetrada [juiz Sergio Moro], como ela mesmo o reconhece, vendo-se diante de indícios de participação de parlamentar federal nos fatos apurados [então deputado André Vargas], promoveu, ela própria, o desmembramento do até então processado, remetendo apenas parte dele ao Supremo Tribunal Federal. Ocorre, porém, que o Plenário desta Suprema Corte mais de uma vez já decidiu que ‘é de ser tido por afrontoso à competência do STF o ato da autoridade reclamada que desmembrou o inquérito, deslocando o julgamento do parlamentar e prosseguindo quanto aos demais’. (…)

É certo que [n]a jurisprudência do Tribunal [tem] se adotado, mais recentemente, orientação no sentido de promover, sempre que possível, o desmembramento de inquérito (…) Todavia, essa orientação não autoriza que o próprio juiz de primeiro grau se substitua à Suprema Corte, promovendo, ele próprio, deliberação a respeito do cabimento e dos contornos do referido desmembramento.”
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> Data: 23 de setembro de 2015
Quem julgou: Plenário, por maioria de votos
Quem foi atendido: investigados por supostas fraudes no Ministério do Planejamento

“Não se vislumbra, portanto, como a prova de crimes em tese ocorridos naquela sociedade de economia mista [Petrobras], relativos a pagamentos de vantagens indevidas para obtenção de contratos, possa influir decisivamente na prova de crimes supostamente praticados no âmbito do Ministério do Planejamento”, avaliou o relator, ministro Dias Toffoli.

“Não se cuida, a toda evidência, de censurar ou obstar as investigações, que devem prosseguir com eficiência para desvendar todos os ilícitos praticados, independentemente do cargo ocupado por seus autores. Cuida-se, isso sim, de se exigir a estrita observância do princípio do juiz natural (…)
O fato de um juiz de um foro em que encontrado um cadáver ser o primeiro a decretar uma medida cautelar na investigação não o torna prevento, nos termos do art. 83 do Código de Processo Penal, para a futura ação penal caso se apure que o corpo tenha sido apenas ocultado naquela localidade e que o homicídio, em verdade, tenha-se consumado em outra comarca. Nessa hipótese, prevalece o forum delicti commissi (foro do lugar da infração), critério primário de determinação da competência, pois a prevenção não pode se sobrepor às regras de competência territorial.”
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> Data: 2 de outubro de 2015
Quem julgou: Teori Zavaski
Quem foi atendido: réus acusados de pagamento de propina para a construção da usina Angra 3, licitada pela Eletronuclear

“Não tendo havido prévia decisão desta Corte sobre a cisão ou não da investigação ou da ação relativamente aos fatos delituosos indicados, envolvendo parlamentar federal, fica delineada, nesse juízo de cognição sumária, a concreta probabilidade de violação da competência prevista no art. 102, I, l, da Constituição da República, ainda que involuntariamente.

Embora não tenham sido indicados os nomes ou os cargos dos ‘agentes políticos’ referidos no depoimento, a simples menção de envolvimento de qualquer deles nos fatos delituosos apontados já seria robusto indicativo para alteração da competência (…). É de se estranhar, portanto, que, na oportunidade da tomada do depoimento, as autoridades responsáveis pela diligência não tenham tido o elementar cuidado de questionar o colaborador sobre a identidade dos agentes políticos beneficiários das supostas propinas.

De qualquer modo, em depoimento prestado na Polícia Federal, o ora reclamante confirmou a existência da reunião e confirmou que, na oportunidade, o senador Edison Lobão, então ministro de Minas e Energia, havia solicitado contribuição eleitoral para o PMDB (…) Enfatiza-se que, segundo reiterada jurisprudência desta Corte, cabe apenas ao Supremo Tribunal Federal, e não a qualquer outro juízo, decidir sobre a cisão de investigações envolvendo autoridade com prerrogativa de foro na Corte, promovendo, ele próprio, deliberação a respeito do cabimento e dos contornos do referido desmembramento.”
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Exercício da defesa
Data: 21 de janeiro de 2015
Quem julgou: Ricardo Lewandowski
Quem foi atendido: Carlos Alberto Pereira da Costa, administrador da GFD Investimentos

“Verifica-se, pois, que o juízo processante negou ao reclamante acesso aos autos do Inquérito 5064906-23.2014.404.7000/PR de forma fundamentada, mencionando, para tanto, além do caráter sigiloso das investigações em andamento, a inexistência de direito de defesa a ser exercido, por ora, pelo reclamante, ante a ausência de indiciamento (…)

Entendo que a negativa de acesso aos autos do Inquérito não se afigura razoável. Vale dizer, o acesso aos elementos de prova, que já documentos e digam respeito ao reclamante, ainda que não indiciado, deverão ser a ele franqueados, mediante imediato acesso aos autos dos caderno investigatório, e não apenas nas 48 horas anteriores a sua intimação para prestar depoimento, como forma de resguardar o exercício do direito de defesa.”
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Data: 16 de junho de 2015
Quem julgou: Teori Zavascki
Quem foi atendido: executivos da OAS

“O requerimento de acesso aos registros de áudio e vídeo dos mencionados depoimentos de Augusto Ribeiro de Mendonça Neto e Julio Gerin de Almeida Camargo foi negado pelo juízo reclamado com o fundamento de que a medida não seria necessária, assim como poderia implicar violação à imagem do colaborador. (…)

A Lei 12.850/2013, quando regula a colaboração premiada em investigações criminais, impõe regime de sigilo ao acordo e ao procedimento correspondente (art. 7º), sigilo que, em princípio, perdura até a decisão de recebimento da denúncia (…) Essa restrição, todavia, tem como finalidades precípuas (a) proteger a pessoa do colaborador e de seus próximos (…) e (b) garantir o êxito das investigações (art. 7º, parágrafo 2º). No caso específico dos colaboradores Augusto Ribeiro de Mendonça Neto e Julio Gerin de Almeida Camargo, essas circunstâncias não se revelam presentes, tendo em vista que já tiveram as identidades e imagens expostas publicamente.”
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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Prisões irregulares
> Data: 7 de abril de 2015
Quem julgou: 8ª Turma
Quem foi atendido: João Auler, presidente do conselho de administração da construtora Camargo Corrêa

“Traz o decreto de preventiva como novo o fundamento o fato dos advogados dos acusados e das empreiteiras terem tentado obter influência política em favor de seus clientes [por meio de reunião com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo] (…) Embora seja notório que tal reunião tenha de fato ocorrido, não se tem nos autos nenhum fato concreto que justifique a imposição de medida tão extrema”, escreveu o relator, desembargador federal João Pedro Gebran Neto.

“Não se tem conhecimento do teor da conversa entre os advogados e o ministro da Justiça. Ademais, ainda que pareça moralmente questionável a tática de alguns poucos advogados de se reunirem com uma das mais altas autoridades do Poder Executivo, não há ilegalidade quanto a isso. Do encontro, não há narrativa de nenhuma interferência efetiva no processo, de modo a colocar em risco as investigações ou a instrução. Mesmo que alguma tentativa de influência tivesse ocorrido, (…) as consequências jurídicas deveriam ser espraiar para além daqueles que se acham segregados.”
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> Data: 15 de abril de 2015
Quem julgou: 8ª Turma
Quem foi atendido: Ricardo Ribeiro Pessôa, presidente afastado da empreiteira UTC Engenharia

“Da mera reunião com o ministro da Justiça, é inviável supor que há claro risco à autonomia e independência constitucional dos órgãos jurisdicionais. Inexistindo, assim, nenhum ato concreto capaz, efetivamente, de prejudicar a aplicação da lei penal e que justifique o novo decreto de prisão preventiva, impõe-se a sua revogação”, disse em seu voto o desembargador federal João Pedro Gebran Neto, relator do caso.
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Falta de provas para condenações
> Data: 22 de setembro de 2015
Quem julgou: 8ª Turma
Quem foi atendido: André Catão de Miranda, gerente do Posto da Torre

“Para que fosse possível reputar o acusado como penalmente responsável pela lavagem de dinheiro decorrente dos depósitos que realizou, seria indispensável a convicção acima de qualquer dúvida razoável no sentido de que teria executado de modo consciente as ordens criminosas de Carlos Habib Chater [dono do posto]; seria preciso afirmar a clara percepção do apelante de que estava a contribuir para o cometimento do crime de lavagem de capitais”, avalia o relator do acórdão, Leandro Paulsen.

“Verificou-se que a feitura de pagamentos em nome do Posto da Torre consistia em sua atividade diuturna e que, portanto, não tinha razão para duvidar que as ordens que cumpria extrapolavam os limites de sua costumeira atividade de gerente financeiro da empresa. A tese de defesa, assim, é verossímel e não foi desmentida por elementos concretos que apontem para o dolo da conduta.

Ademais, considerando que a conduta pura e simples de depositar valores pode ser lícita (…), entendo que incide na hipótese o art. 22 do Código Penal, segundo o qual o cumprimento de ordem não manifestamente ilegal do superior hierárquico implica punição apenas do autor da ordem. Portanto, por não existir prova suficiente para a condenação, deve o réu André ser absolvido.”
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> Data: 10 de dezembro de 2015
Quem julgou: 8ª Turma
Quem foi atendido: Nelma Kodama, doleira

“Narra a denúncia que Nelma Mitsue Penasso Kodama dissimulou e ocultou a propriedade de um automóvel Porsche Cayman em nome de Rafael Pinheiro do Carmo, adquirido em novembro de 2013 pelo valor de R$ 225.000,00 com o produto dos crimes de operações ilegais no mercado paralelo de câmbio e de evasão de divisas. (…) No caso, entendeu o magistrado a quo pela configuração do delito de lavagem”, relatou o desembargador federal João Pedro Gebran Neto.

“É assente na jurisprudência que o mero proveito econômico do produto do crime não configura lavagem de dinheiro, que requer a prática das condutas de ocultar ou dissimular. (…) A ré, em seu interrogatório, relatou que participou da negociação do bem, mas que o dinheiro para pagamento era de sua mãe. Disse, também, que iria transferir o automóvel após a quitação. Observa-se que, embora não haja dúvidas de que foi Nelma quem negociou o automóvel, não restou devidamente comprovada a origem dos valores transferidos para pagamento.

Na hipótese, diante apenas da manutenção do registro do bem em nome do antigo proprietário por pouco tempo após a quitação – conduta que, quando muito, poderia configurar ato preparatório -, não está caracterizado o crime de lavagem de dinheiro.”
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Exercício da defesa
> Data: 24 de setembro de 2014
Quem julgou: João Pedro Gebran Neto
Quem foi atendido: Carlos Habib Chater, dono de posto usado para lavagem de dinheiro

“Narra a defesa que, ao longo das investigações e das ações penais o magistrado de origem ‘vem desrespeitando o disposto no Código de Processo Penal e aplicando uma forma totalmente inovadora de intimação dos advogados e início da contagem de prazo para os defendentes’. Sustenta que a autoridade coatora [juiz Sergio Moro] vem determinando a realização de intimações por meio telefônico (…)

A exceção da sistemática de intimações do processo eletrônico comporta temperamentos, sobretudo quando o aguardo da intimação pelas vias normais, puder resultar prejuízo a qualquer das partes do processo ou perecimento do próprio direito discutido. Não é este o caso dos autos porém. Em se tratando de ato processual sem nenhuma peculiaridade que lhe exija celeridade extraordinária, deve prevalecer a regra geral do processo eletrônico.”
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> Data: 7 de agosto de 2015
Quem julgou: João Pedro Gebran Neto
Quem foi atendido: Renato Duque, ex-diretor da Petrobras

“Informa a defesa que a Petrobras instituiu Comissões Internas de Apuração/Auditoria, com a finalidade de, grosso modo, verificar a licitude de contratos firmados no âmbito da empresa. Diz que, durante a instrução, requereu a juntada dos relatórios das referidas CIAs [mas o pedido foi negado pelo juiz Sergio Moro]. (…)

Vejo como bastante razoável o pedido da defesa (…) Calha referir que não se trata de prova de difícil ou improvável obtenção, tendo a Petrobras inclusive anotado para a possibilidade de cumprir a decisão judicial até o dia 14/08/2015. Mesmo que se esteja diante de processo com réus presos, não se mostra excessivo o tempo extra de processo necessário à busca da verdade real.”
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> Data: 1º de outubro de 2015
Quem julgou: 8ª Turma
Quem foi atendido: ex-deputada Aline Corrêa

“A cronologia processual está a exigir que previamente à audiência haja tanto a citação, quanto a defesa preliminar e sua apreciação”, disse o desembargador federal João Pedro Gebran Neto, relator. “Foram realizadas audiências nos dias 23 e 26/06/2015. Na primeira delas, a corrigente Aline Lemos Correa de Oliveira Andrade deu­-se por citada, passando, então, a fluir o prazo para apresentação de resposta à acusação. A resposta à acusação foi juntada aos autos em 01/07/2015 (evento 135). Analisando a peça defensiva inicial, verifica­-se que há expressa referência à imprestabilidade da denúncia e à inexistência do fato tido por ilícito. Assim, flagrante a inversão processual, na medida que houve inversão na ordem processual.

A teor do disposto no art. 396 e seguintes, do Código de Processo Penal, ao receber a denúncia o magistrado deverá citar o réu para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 dias. Esta resposta é obrigatória, na forma do art. 396­A, § 2º, do mesmo diploma. Após a apresentação da resposta o juiz deverá decidir acerca das arguições preliminares da defesa, podendo, se for o caso, absolver sumariamente o acusado, segundo a dicção do art. 397, ainda do CPC. Vencida esta fase preambular, passa­-se à colheita de provas, mediante diligência e audiência de instrução e julgamento.”
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Bloqueio do WhatsApp é criticado por fundadores do aplicativo e do Facebook

A determinação feita pela 1ª Vara Criminal de São Bernardo do Campo (SP), para que as operadoras de telefonia móvel bloqueiem o aplicativo WhatsApp por 48 horas, contadas a partir da madrugada desta quinta-feira no Brasil, foi alvo de críticas nas redes sociais pelo fundador do Facebook, Mark Zuckerberg.

A medida foi também criticada pelo diretor executivo e cofundador do WhatsApp, Jan Koum. O WhatsApp foi adquirido pelo Facebook em 2014.

Em sua página no Facebook, Zuckerberg lamentou o bloqueio do aplicativo para mais de 100 milhões de usuários brasileiros e disse estar trabalhando para reverter a situação. “Até lá, o Messenger do Facebook continua ativo e pode ser usado para troca de mensagens”, disse o empresário.

– Este é um dia triste para o país. Até hoje, o Brasil tem sido um importante aliado na criação de uma internet aberta. Os brasileiros estão sempre entre os mais apaixonados em compartilhar suas vozes online. Estou chocado sobre o fato de que nossos esforços para proteger dados pessoais poderiam resultar na punição de todos os usuários brasileiros do WhatsApp pela decisão extrema de um único juiz, acrescentou.

Zuckerberg disse esperar que a Justiça brasileira reverta rapidamente essa decisão. “Se você é brasileiro, por favor faça sua voz ser ouvida e ajude seu governo a refletir a vontade do povo”, completou.

Também por meio do Facebook, Jan Koum disse estar “desapontado com a visão míope” que resultou no bloqueio do acesso ao aplicativo que, segundo ele, é “uma ferramenta de comunicação da qual tantos brasileiros passaram a depender”.  “É triste ver o Brasil se isolar do resto do mundo”.

Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo, o bloqueio foi imposto porque o WhatsApp não atendeu a uma determinação judicial de 23 de julho deste ano.

No dia 7 de agosto, a empresa foi novamente notificada e foi fixada multa em caso de não cumprimento. Como, ainda assim, a empresa não atendeu à determinação judicial, o Ministério Público requereu o bloqueio dos serviços pelo prazo de 48 horas, com base na lei do Marco Civil da Internet, o que foi deferido pela juíza Sandra Regina Nostre Marques.

Em fevereiro deste ano, o juiz Luiz Moura, da Central de Inquéritos da Comarca de Teresina, determinou a suspensão do aplicativo Whatsapp em todo o território nacional, mas a decisão foi revogada por um desembargador do Tribunal de Justiça do Piauí.

Em nota, o Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (SindiTelebrasil) confirmou o cumprimento da determinação judicial recebida na quarta-feira, e que não foi o autor do requerimento para o bloqueio do aplicativo. A decisão foi proferida em um procedimento criminal, que corre em segredo de Justiça.

A fim de burlar a decisão judicial, diversos usuários da rede social estão sugerindo a instalação de aplicativos que, ao adotar um IP alternativo com origem em outros países, possibilitam o funcionamento do WhatsApp.

Com informações do Correio do Brasil

Chacina de Unaí: Ex-prefeito é condenado a quase 100 anos de prisão

O fazendeiro e ex-prefeito de Unaí (MG) Antério Mânica foi condenado a uma pena de 99 anos, 11 meses e quatro dias de prisão por ser um dos mandantes dos homicídios dos três fiscais do Trabalho e de um motorista no crime que ficou conhecido Chacina de Unaí.

A sentença foi proferida pelo juiz Murilo Fernandes na noite de ontem (5). O julgamento ocorreu na sede da Justiça Federal, em Belo Horizonte (MG). Mânica poderá recorrer em liberdade.

Em 28 de janeiro de 2004, os auditores fiscais do Trabalho Eratóstenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva e o motorista Ailton Pereira de Oliveira foram executados a tiros, enquanto se preparavam para uma fiscalização em fazendas de feijão da zona rural da cidade, suspeitas de contratarem trabalhadores irregularmente.

Na semana passada, a Justiça condenou o fazendeiro Norberto Mânica, irmão de Antério Mânica, também acusado de ser mandante do crime, e o empresário José Alberto de Castro, apontado como intermediário, pela chacina. Norberto Mânica foi condenado a pena de 98 anos, 6 meses e 24 dias de prisão e Castro a 96 anos, 5 meses e 22 dias. Ambos poderão recorrer em liberdade.

Antério foi eleito prefeito de Unaí em 2004 e 2008. Durante este período tinha direito a julgamento em foro especial e, por esse motivo, seu processo tramitou em separado ao dos outros acusados.

Último réu envolvido no processo, Hugo Alves Pimenta, depois de firmar acordo de delação premiada, teve o processo desmembrado e começa a ser julgado na próxima terça-feira (10). Ele é acusado de ser o intermediário na contratação de pistoleiros. Pimenta é acusado de ser o intermediário entre pistoleiros e mandantes.

Com informações de Ag. de Notícias e EBC

Maioridade Penal: Secretários de Justiça de 24 estados divulgam manifesto contra a redução

Palavra-Livre-maioridade-penal-secretarios-justica-manifesto-contra-reducaoO diretor do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Renato Devitto, manifestou ontem (2) preocupação com a nova emenda que reduz de 18 para 16 anos a maioridade penal, aprovada na madrugada desta quinta-feira (2), em primeiro turno, na Câmara dos Deputados. Devitto divulgou um manifesto contra a medida, assinado por 24 dos 27 secretários de Justiça do país, que será entregue a parlamentares das duas Casas.

O texto pede a realização de estudos de impactos econômicos e sociais da aplicação da proposta que reduz a idade mínima para que uma pessoa possa ser julgada criminalmente por seus atos como um adulto, antes da votação em segundo turno. “A discussão da emenda no Congresso seria muito enriquecida se os parlamentares pudessem conhecer esses impactos e debatê-los com a sociedade brasileira”. Os secretários de Justiça de São Paulo, Sergipe e Goiás não assinaram o manifesto.

A nova emenda à Constituição aprovada pela Câmara mantém a redução para os crimes de estupro, sequestro, latrocínio, homicídio qualificado e outros (crimes hediondos), homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte. Também mantém a regra de cumprimento da pena em estabelecimento separado dos destinados aos maiores de 18 anos, a dos menores inimputáveis e propõe a criação de estabelecimentos específicos para que os adolescentes cumpram a pena.

“Para nós, é muito claro, e praticamente uma unanimidade entre os secretários de Justiça, que não resolveremos a violência urbana apostando no aumento da população prisional. O contingente de adolescentes que requerem um procedimento especial é mais um problema com que nós, gestores, teremos que lidar”, disse Devitto.

Segundo o diretor do Depen, o sistema prisional já tem déficit de 231 mil vagas e, se a proposta for aplicada, “dezenas de milhares de adolescentes” vão entrar nele. Hoje são 607 mil presos para 376 mil vagas. Uma redução da maioridade penal, segundo ele, aumentaria em cerca de 40 mil o número de pessoas.

Os secretários de Justiça do Piauí, do Espírito Santo e de Mato Grosso também participaram da entrevista coletiva em que foi divulgado o manifesto. Para o secretário de Justiça do Piauí, Daniel Oliveira, a colocação da matéria em pauta, um dia após ter sido rejeitada no plenário da Câmara, foi uma manobra inconstitucional. “Acredito também que a manobra legislativa que foi implementada ontem na Câmara dos Deputados padece de vício de inconstitucionalidade. Falo isso como advogado e como operador do direito”, disse Oliveira.

O secretário de Justiça do Piauí afirmou ainda que a própria redução da maioridade penal fere uma cláusula pétrea da Constituição. “A Constituição disciplina um conjunto de diretrizes, e uma delas é a cláusula pétrea que proíbe o retrocesso em matérias de direitos e garantias fundamentais. E essa, sem dúvida alguma, é uma ofensa a todo o ordenamento jurídico de garantias e direitos fundamentais previstos.”

O discurso dos secretários e do diretor da Depen coincidem com declarações do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que manifestou preocupação com a medida. Ontem, horas antes da aprovação da emenda aglutinativa, Cardozo disse que não há espaço nas prisões para separar os adolescentes do resto da população carcerária, como reza o texto dos deputados.

“Até que se criem as vagas para os adolescentes de 16 e 17 anos, eles serão trancados nos presídios atuais e as organizações criminosas vão cooptar esses jovens. E, quando o Brasil acordar disso, já teremos perdido muitas vidas”.

Com informações da Ag. Brasil